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Blog Editor

May 18th, 2015

As missões cristãs e o surgimento do nacionalismo em Angola

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Estimated reading time: 5 minutes

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Iracema Dulley da LSE examina as ligações entre as missões cristãs e a ascensão dos líderes dos movimentos de libertação na África. Read in English

Na África subsariana, muitos dos líderes que participaram na luta de libertação anti-colonial e na administração dos países africanos pós-coloniais foram educados em missões cristãs. Uma lista concisa destas pessoas inclui indivíduos tais como Nelson Mandela, Kwame Nkrumah, Samuel Nujoma e Eduardo Mondlane. Em Angola, Agostinho Neto, Jonas Savimbi e Holden Roberto foram todos educados em missões cristãs. Por conseguinte, a relação entre a educação numa missão e a liderança política não é aleatória. Embora existam diferenças quanto ao contexto em que estes atores foram criados, talvez nos seja possível, através da análise de um caso específico deste fenómeno, compreender como a ação missionária ajudou a moldar a disposição dos futuros líderes pós-coloniais. O foco do meu artigo não é, no entanto, a trajetória dos líderes; mas, o período que precede o envolvimento de um deles na luta anti-colonial.

Daniel Chipenda, left, pictured on a trip to Lisbon in 1981, was part Angola's struggle against colonialism
Daniel Chipenda, left, pictured on a trip to Lisbon in 1981, was part Angola’s struggle against colonialism

Através da biografia de Jesse Chipenda (1903-1969), uma figura importante na missão congregacionalista em Angola, é possível ponderar sobre as condições sociais, históricas e políticas que permitiram a seu filho, Daniel Chipenda, desempenhar um papel na libertação de Angola.

Daniel Chipenda foi um dos comandantes da guerra de independência angolana que dirigiram a Revolta do Leste (1973) a partir de dentro do MPLA (Movimento Popular de Libertação de Angola). Se a revolta foi o resultado de uma clivagem na estrutura do MPLA, na qual as velhas elites crioulas de Luanda tiveram de enfrentar a oposição das elites menos prestigiosas formadas por missões cristãs durante o período colonial[i], é importante compreeder o contexto no qual tais divisões têm sua origem e como esta elite de segunda ordem se formou. O meu artigo reconstitui o contexto no qual a relação entre Jesse Chipenda e a missão protestante do Planalto Central de Angola foi iniciada: a transição de um mundo pré-colonial, no qual os habitantes da região falantes do umbundu dominaram a política e o comércio até ao início do domínio colonial, depois da derrota militar das constituições políticas locais pelos portugueses na Guerra do Bailundo (1902-1903).

Jesse Chipenda nasceu no Bailundo em 1903, ano em que o Planalto Central foi militarmente submetido ao domínio português. Jesse era filho de Chipenda, o poderoso chefe de Lomanda, um ex-comerciante de caravana que se opôs à presença colonial na região. Chiula, como Jesse era então chamado, foi criado na aldeia do pai, onde sua mãe era uma das numerosas esposas do chefe. Alegadamente, depois do divórcio dos seus pais, visitou a mãe na sua aldeia e lá se converteu ao cristianismo contra a vontade do pai. Depois da sua conversão passou a frequentar a escola congregacionalista e cultos dirigidos por um catequista nos arredores da aldeia do seu pai, mas foi também expulso do território do pai. Depois de ter sido acolhido em casa do catequista em troca de tabalho, Chiula será enviado para a escola da missão, onde virá a ser um excelente estudante.

São muito significativas as semelhanças entre a biografia de Chiula e as biografias de outros jovens, filhos de chefes africanos que decidiram abraçar o cristianismo e as suas promessas de mobilidade social ascendente. O mais conhecido de todos é certamente Nwoye, filho do chefe Okonkwo no fascinante romance de Chinua Achebe, Quando tudo se desmorona[ii]. Mas, ao contrário de Nwoye, Chiula, que se tornou Jesse Chiula Chipenda no dia do seu batizado, virá a restabelecer a relação com o pai, que finalmente compreendeu a importância da educação no mundo colonial. Jesse tornou-se um mediador eficaz entre a aldeia do seu pai e a administração colonial. O filho do chefe rapidamente subiu na hierarquia da missão e se tornou professor, pastor e um assimilado – termo informalmente usado para designar africanos que eram anteriormente “indígenas”, mas passavam a ser cidadãos portugueses (de segunda classe) ao darem provas daquilo que a administração colonial considerava como comportamento “civilizado”, isto era, ser alfabetizado e possuir fluência escrita e verbal em português.

A biografia de Jesse Chiula Chipenda é uma janela para o processo no qual um conjunto des disposições incorporadas virá a formar futuros líderes africanos. O desenvolvimento da sua vida é um ponto de partida interessante para entender a transição do mundo pré-colonial ao mundo colonial e permite uma compreensão histórica mais profunda das condições que permitiram a emergência de atores como Daniel Chipenda, um líder anti-colonial filho de um pastor protestante, neto de um chefe e comerciante de caravana no Bailundo.

 

Iracema Dulley é vinculada à London School of Economics como Visiting Fellow[iii], no departamento de antropologia, e pesquisadora no Centro Brasileiro de Análise e Planejamento. Siga este link para saber mais sobre Iracema Dulley.

 

[i] Christine Messiant. L’Angola colonial: histoire et société : les prémisses du mouvement nationaliste. Besel : Schlettwin, 2006.

[ii] O Mundo se despedaça (português brasileiro).

[iii] Pesquisadora visitante.

 

The views expressed in this post are those of the author and in no way reflect those of the Africa at LSE blog or the London School of Economics and Political Science.

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